Sede Vacante em Uruaçu e suas lições. Uma leitura à luz da fé

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1970

Estamos às vésperas da posse do nosso novo bispo, Mons. Giovani Carlos Caldas Barroca. Com isto a nossa sede deixa de estar vacante. Este estado perdurou por um ano e sete meses. Quero iniciar uma leitura deste período de nossa história à luz da fé.

No início da vacância lancei uma questão para a Diocese: “Senhor, como viver este tempo de vacância da Diocese de Uruaçu?”. As respostas nos indicaram vivê-lo na fé, esperança e caridade. Deveria nos acompanhar o senso de pertença, corresponsabilidade e comunhão. E assim foi. Os fatos testemunham a ação do Espírito Santo nesta Igreja Particular.
Começo pela transferência de Dom Messias para a nova missão. Sentimos sua partida. Ele era nosso pastor, um membro de nossa família. Pela fé entendemos a missão e a universalidade da Igreja e não aprisionamos pelos afetos nosso antigo bispo.

Iniciou-se no dia 16 de fevereiro de 2019 o período de sede vacante. Ao mesmo tempo foi desencadeado na Diocese o tempo de intercessão e súplica por um novo pastor. Nossa Igreja se mostrou ser orante e humilde: é o Senhor quem nos dará um novo bispo segundo o seu tempo e não o nosso.

No dia 19 de fevereiro foi eleito o primeiro padre administrador diocesano, figura nova e diferente. Outrora tivemos bispos administradores (Dom José Chaves e Dom Messias). Devo reconhecer o mérito de nossos diocesanos, pois souberam acolher e respeitar ao longo da vacância este ministério eclesial provisório. A Diocese caminhou na ordem e obediência. O Espírito Santo nos formou nestas virtudes e pudemos vê-las com maior clareza.

No dia 15 de maio de 2019 fomos surpreendidos divinamente com a eleição episcopal de nosso irmão Pe. José Francisco Rodrigues do Rêgo, como bispo de Ipamerí, e a sua ordenação no dia 04 de agosto. Tivemos também a ordenação presbiteral do diác. Ricardo e a ordenação diaconal dos acólitos Marcos Alan, Suenis e Mozair em 2020. Sediamos os votos perpétuos de Irmã Magda, da Paróquia Imaculado Coração de Maria, em Itapaci, membra da Congregação das Dominicanas de Santa Catarina de Sena. Neste mesmo ano foi ordenado diácono Frei Paulo, da Paróquia Nossa Senhora d’Abadia, em Niquelândia, membro da Ordem dos Frades Menores, pertencente à Custódia da Terra Santa. Em torno de 450 casais se uniram em matrimônio. Leigos renovaram suas consagrações e promessas. E foi assim: alguns plantaram, outros cuidaram e nós colhemos estes frutos vocacionais. Desta maneira, pudemos perceber como esta Igreja é viva e frutífera. Mesmo vacante, o Espírito Santo agiu nos corações destes fiéis conduzindo-os ao altar do Senhor.
Por outro lado, aprendemos novamente que os operários não são para nós mesmos e sim para os outros; formamos discípulos para a Igreja e não exclusivamente para nossa Diocese. As partidas de Dom Messias e de Dom José Francisco foram duas grandes perdas. Fomos inclusive tentados a cantar “deixai aqui, Senhor, nossos operários” alterando a oração vocacional. Se isso tivesse ocorrido, teria sido um grande equívoco. Os batizados são missionários por natureza. Deixemos estes irmãos partirem.

Em dezembro de 2019 realizamos a avaliação diocesana de pastoral. Foi um exercício de escuta, encontro, exame de consciência, comunhão, corresponsabilidade na missão, diálogo e gratidão a Deus por sua ação em nossa Igreja. Nesta ocasião estampou-se o crescimento da sinceridade entre nós, o temor diante da missão nos tempos de hoje e a abertura para as indicações evangelizadoras do episcopado brasileiro como sinal de nossa comunhão.

Aliás, mesmo em sede vacante, não perdemos os vínculos com a Sé de Pedro e as outras instâncias de serviço e comunhão da Igreja Católica no Brasil. Participamos de assembleias nacionais e regionais e de outros encontros. O ápice foi a minha participação na visita ad limina apostolorum em fevereiro de 2020. Com isto, evidenciou-se o nosso espírito de comunhão com as demais dioceses mostrando-se que sozinhos não se faz missão.
Em janeiro de 2020 as Irmãs Escravas do Divino Coração encerraram sua missão de cinco décadas em Goianésia. Este acontecimento, ligado a falta de vocações à vida consagrada, ao lado do considerável número de saída de seminaristas de nosso Seminário em 2019, nos interroga sobre a nossa parte na promoção vocacional. Temos 20 seminaristas. É um número satisfatório para uma diocese como a nossa? Não. É preciso pensar largamente: padre é para a Igreja; padre nunca sobra, sempre falta, pois os sonhos de Deus são grandes.

Neste tempo de vacância também sofremos com os irmãos presbíteros que deixaram o ministério. Com um gesto de sinceridade e autenticidade se foram serenos. Eles permanecem sempre filhos da Igreja e nossos irmãos.

Quero destacar o valor e a atuação de três instâncias de comunhão: o Colégio de Consultores, o Conselho Diocesano de Pastoral e o Conselho Econômico Diocesano. As questões de maior impacto sobre a vida diocesana passaram pelo coração daqueles que compõe estes grupos, principalmente os Consultores. Saíram deles as grandes decisões. Eu propunha, eles decidiam e eu executava com a cooperação direta de alguns membros do Clero e funcionários da Cúria. Juntos enfrentamos situações de diferentes ordens, complexidades e tensões. Sentimos o que significa governar uma diocese. Atesto que a caridade, a justiça, o valor e a história de cada pessoa e comunidade foram os critérios evangélicos para as decisões. O Espírito Santo nos fez vivenciar de outra maneira e com grau de intensidade diferente a indicação conciliar de uma Igreja sinodal.

A Diocese de Uruaçu se mostrou uma Igreja Povo de Deus, corpo de Cristo formado por diferentes membros agraciados pelos dons dos ministérios pelos quais ajudamos uns aos outros no caminho da salvação, como nos indica a Lumen Gentium.

Chegou a pandemia do novo coronavírus. A incerteza, o desconhecido, o medo e a insegurança povoaram o interior de muitos de nós. Tantas eram as perguntas e poucas respostas se tinha. Precisamos da compreensão e da paciência de todos. Para nós foi um exercício heroico da fé. Quase que nos foi necessário reescrever o livro do Gênesis contendo a reinvenção da vida eclesial e social. Evidenciaram-se algumas lacunas catequéticas litúrgicas e sacramentais. Introduzimos elementos e redescobrimos instrumentos pastorais que, mesmo terminando a pandemia, eles deverão permanecer. É o caso da internet e as redes sociais. Parece que não percebíamos, mas havia um desequilíbrio entre pastoral sacramental e pastoral evangelizadora. Isto ficou evidente com a pandemia. É algo que precisa ser refletido e sanado.

Em meio a tudo isso, temos conseguido viver e gerenciar evangelicamente a crise da covid-19. A situação nos pediu e fomos capazes de ser solidários. Ficamos mais pobres, todavia nos tornamos mais ricos em virtude. A Cúria diocesana gastou mais do seu saldo para sustentar as pessoas e as estruturas em função da missão apostólica; Paróquias se ajudaram economicamente; empenhamo-nos para evitar ao máximo a demissão de funcionários; projetos solidários em prol dos idosos, das pessoas em situação de rua, dos desempregados e necessitados de alimento ganharam novo impulso. São inúmeras as ações pessoais, silenciosas e significativas, de caridade conhecidas por Deus.

Enfim, neste um ano e sete meses a vida diocesana não parou nenhum momento. Na verdade, a missão não poderia parar, pois as pessoas têm sede de Deus. O tempo de sede vacante evidenciou uma Igreja Particular moldada segundo as linhas do Concílio Vaticano II. Os sinais evangélicos evidenciados são frutos da semente que caiu em terra boa e da evangelização e catequese dos diocesanos das primeiras horas, muitos deles ainda vivos intercedendo pelos fiéis de agora. A Diocese de Uruaçu se mostrou uma Igreja Povo de Deus, corpo de Cristo formado por diferentes membros agraciados pelos dons dos ministérios pelos quais ajudamos uns aos outros no caminho da salvação, como nos indica a Lumen Gentium.

A nossa união com Jesus Cristo nos levou a este forte momento de comunhão. Isto é um dos grandes testemunhos que fica do tempo da sede vacante: fomos comunhão, corresponsáveis e zelosos com a esposa de Cristo, a Igreja. Nós amamos nossa Diocese. Estes valores cravados em nossa alma diocesana serão a força para enfrentarmos os desafios que estão aí e nos pedem soluções a médio e longo prazo nos campos administrativos, pastoral e formação do Clero.

Por último, desde os fatos de maior impacto aos menores, em todos eles estava o Espírito Santo a nos conduzir e a nos dizer algo em vista de formar em nós as feições de Jesus Cristo. O tempo inteiro fomos amparados por Nossa Senhora em seu imaculado coração.
Está chegando o momento: o nosso quarto bispo, Mons. Giovani Carlos Caldas Barroca, está às vésperas de iniciar o seu pastorei entre nós. É a hora da graça. É uma ocasião especial para um bom exame de consciência, renovar as promessas do Batismo e começar a escrever uma nova página diocesana com maior fidelidade a Cristo que nos ama e nos chama a responder com maior empenho os apelos da evangelização.

Deixo a você, diocesano, completar estas linhas, pois creio que o Espírito Santo também fala ao seu coração sobre estes últimos fatos ocorridos conosco…

Pe. Francisco Agamenilton Damascena
Administrador Diocesano