Todas as culturas humanas tem necessidade de espaços de festa, de alegria incontida e renovadas para resgatar o que Harvey Cox chamava de homem festivus ou lúdico (que brinca). Há algo digno de resgate, a capacidade de deslumbrar-se e imaginar da criança, a fantasia que explode num festival de cores, e ritmos inusitados. É verdade que a cultura carnavalesca apresenta também riscos e ocasiões que podem prejudicar a saúde física e espiritual. No entanto o abuso não tolhe o legítimo uso de pular e dançar com alegria como o Rei Davi e o próprio João Batista no ventre materno.
Como não apreciar o carnaval familiar de rua, ou de blocos tradicionais que irmanam a vizinhança e despertam a uma convivialidade muito densa. Mesmo nos desfiles e nos enredos das escolas de samba, quanta beleza e criatividade, homenageando pessoas e valores humanos e cristãos. Às vezes esquecemos que o pudor nasce no interior da pessoa, que se resguarda ou cuida o seu olhar libertando-se da malícia e da cobiça inspirada por desejos de posse agressivos e predatórios, esquecendo que a criação é boa, o que é contaminado e turvo reside na nossa forma de olhar.
Assim com a espontaneidade dos pequenos e dos simples muitos pulam e se divertem brincando e acolhendo aos outros com alegria e cordialidade. A roda de samba, as marchinhas e músicas cantadas no carnaval, que integram as pessoas, sendo envolventes e singelas, revelam de forma expressiva os sentimentos humanos e as cenas e poesia do cotidiano da vida. Jesus questionava a sua geração que se parecia àquelas crianças que não acompanhavam a brincadeira de seguir o líder, quando era para chorar não choravam e quando era para rir não riam (Lc. 7,31); assim se comportam aqueles que por não gostar de brincar no carnaval julgam ou condenam os foliões.
Admiro aquelas pessoas que não se sentem atraídos pelo barulho ou pela festa , mas se sentem solidários com os que estão se divertindo, rezando por eles, oferecendo água para evitar a desidratação, e como bons anjos da guarda cuidando da integridade dos irmãos carnavalescos. O Reino anunciado por Jesus é apresentado como um banquete onde todos fazem festa, se deliciam e dançam, jovens e idosos; por isso ser cristão é transparecer a alegria, a plenitude e a inteireza da nossa vocação humana para todos (as). Em todo caso o que mais importa no carnaval é vestir como dizia São João Paulo II, na “Carta Novo Millenio Ineunte”, nº 50, a fantasia da caridade pensando e agindo solidariamente, partilhando nossos valores e nossa alegria sempre nova. Que Jesus a verdadeira alegria da humanidade nos ensine o caminho da felicidade e da realização plenas. Deus seja louvado!
Por Dom Roberto Francisco Ferreria Paz – Bispo de Campos (RJ)