“Alegrai-vos sempre no Senhor! Repito: alegrai-vos!” (Fl 4,4). É difícil acreditar que esse convite do apóstolo Paulo à alegria tenha sido escrito não em um momento de sucesso ou de festa, mas quando ele se encontrava na prisão. Não sei o que Paulo escreveria, se vivesse no Brasil de hoje. Tenho minhas dúvidas, contudo, de que se contentasse em aumentar o coro dos pessimistas – isto é, daqueles que são levados pela onda de reclamações, críticas e insatisfações.
Nossos problemas são, reconheçamos, sérios e graves, gerando inquietação e insegurança. Como, pois, ser alegres? De que maneira, para usar a linguagem de Paulo (2Cor 7,4), estar cheios de consolação e transbordar de alegria?
Todos desejam ser felizes. Mas nossa alegria é sempre incompleta e frágil. O homem moderno, que pela técnica consegue multiplicar ocasiões de prazer, não conseguiu, ainda, “fabricar” a alegria autêntica. E, por isso mesmo, tem como constantes companheiros o tédio e a tristeza, a angústia e o desespero, a solidão e o vazio…
A alegria somente será possível se se fizer um renovado esforço para que todos tenham um mínimo de segurança, de justiça e bem-estar. Não há alegria em um ambiente onde falta o sentimento de fraternidade e não se tem uma visão poética das coisas boas que acontecem ao nosso redor. Sem um coração de poeta e de criança, somos incapazes de alegrar-nos diante da vida, do amor, da natureza, do trabalho bem feito, do dever cumprido, da partilha, do sacrifício…
A alegria duradoura, que levou Paulo a desejar experimentá-la mesmo em meio a inquietações, passa pela experiência da fé. Experiência que fez o apóstolo e evangelista João exclamar: “Deus é amor!” (1 Jo 4,16 ). E Agostinho lamentar: “Tarde te amei, ó beleza tão antiga e tão nova, tarde te amei!” (Confissões X, 27).
A alegria é para ser desfrutada por todos. Quando Maria Santíssima a experimentou na casa de Isabel, externou-a num cântico em que engrandece o Senhor (Lc 1,46-55). Jesus fez da alegria um tema constante de suas pregações. Lembrou que ela é sentida pela mulher que encontra a moeda perdida e pelo semeador que faz a colheita; pelo homem que acha um tesouro e pelo pastor que reencontra a ovelha extraviada; pelo pai que acolhe o filho e pelos pequenos que recebem a revelação do Reino. O Filho de Deus desejou que sentíssemos a sua alegria para que, assim, a nossa fosse completa e duradoura (Jo 15,11).
Em meio a nossa crise, precisamos nos recordar de que, assim como só o poeta vê o invisível, ou seja, a essência dos acontecimentos, da natureza e das pessoas, só quem tiver o Espírito de Deus será capaz de saborear a alegria, esse dom que caracteriza os seguidores de Jesus de Nazaré.
Por Dom Murilo S. R. Krieger – Arcebispo de São Salvador