Páscoa ecológica

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A cultura mercantil da modernidade perverte até mesmo símbolos densamente religiosos, entre os quais a Páscoa. Para muitos, ela se reduz ao conto do coelhinho e aos ovos de chocolate, largamente comercializados, que cultivam fantasias vazias de sentido, sobretudo nas crianças. No entanto, muitas delas, educadas por adultos conscienciosos, não se deixam manipular. Gugu Gaiteiro e Carol, duas crianças brasileiras, em um belo vídeo que pode ser acessado na internet, são belos exemplos.

Assim cantam eles: “Não foi o coelhinho que morreu na cruz. Quem foi crucificado foi o meu Jesus. Na sexta ele morreu, mas morto não ficou; domingo de manhã ele ressuscitou. Na Páscoa comemoram a ressurreição, mas muita gente não se lembra disso, não. Existe muita gente que não dá valor ao grande sacrifício do meu Salvador”. 

A atitude responsável dos educadores dessas crianças, desafia-me a partilhar uma reflexão que visa ser também educativa, associando à Páscoa uma temática ecológica, proposta, novamente este ano, pela Campanha da Fraternidade da Igreja Católica. Esta reflexão é, em síntese, minha mensagem de Páscoa dirigida a todas as pessoas de boa vontade, dedicadas à construção de uma sociedade justa, fraterna e saudável, que as próprias crianças, em primeiro lugar, têm direito.

Ao celebrarmos a Páscoa de Nosso Senhor Jesus Cristo, reafirmamos que ele é vencedor do pecado e da morte, e assumimos com ele a condição de ressuscitados (cf. Cl 3,1). Nele nos tornamos novas criaturas, comprometidas em preservar a vida de toda a criação, na qual estamos inseridos e com a qual interagimos. Dependemos da vida de nossos ecossistemas. No entanto, muitos, em lugar de preservarem a natureza, exploram-na abusivamente, com intuito sobretudo mercantil.

Esse alerta feito pela Campanha da Fraternidade, denunciando a degradação de nossos Biomas, expressa nossa indignação diante de gestões públicas e particulares inadequadas, de nossos recursos naturais. Além de pouco ou nenhum investimento em educação ambiental, permite-se a ampla e acelerada devastação de florestas, e a intensa contaminação do solo, da água e do ar, por meio de dejetos não tratados, e agrotóxicos e poluentes químicos e gasosos extremamente nocivos.

Essa Campanha da Fraternidade, com o lema “Cultivar e guardar a criação” (Gn 2,15), sugere-nos uma profunda mudança de princípios e atitudes, bem como iniciativas corajosas que deem provas de conversão, propósito este da quaresma. Nossa Páscoa será autêntica se mudarmos nosso estilo de vida pessoal e social, libertando-nos dos mecanismos que degradam a vida humana e o planeta no seu todo. Pequenas mudanças são possíveis em função de grandes mudanças necessárias.

Valorizemos, divulguemos e apoiemos as muitas iniciativas de educação ambiental que estão sendo realizadas em diversas áreas da sociedade, sobretudo com as novas gerações. Crianças, adolescentes e jovens têm demonstrado um especial interesse e motivação por projetos e ações ecológicas. São louváveis as iniciativas de muitos trabalhadores e trabalhadoras do campo, especialmente jovens, de produzirem, organicamente, alimentos de qualidade e os comercializarem de modo cooperativo.

Transformemos, pois, nosso suposto desenvolvimento econômico destruidor do meio ambiente, concentrador de recursos, socialmente excludente e conflituoso, em desenvolvimento econômico ecologicamente sustentável, cooperativo, socialmente includente e harmonizador de relações. Nossa sociedade necessita fazer a passagem daquele a este sistema de vida. É para essa Páscoa que lutamos. É essa Páscoa que já festejamos, pois Cristo está vivo entre nós, garantindo-nos a vitória.

Por Dom Reginaldo Andrietta – Bispo de Jales