Uma política para a paz

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O Papa Francisco, na mensagem para o Dia Mundial da Paz 2017, convoca todos à adoção de uma política para a paz: a não violência. Esse estilo precisa ser adotado por todos os cidadãos, um compromisso especial a ser assumido principalmente pelos responsáveis por comunidades religiosas, segmentos diversos da sociedade civil, chefes de governos e parlamentares, que têm o dever de ser não violentos. Isso significa não manipular parlamentos e outras instâncias do poder para aprovar medidas que, aparentemente, são avanços, mas na verdade representam mais peso nos ombros dos pobres e indefesos. Assim, uma política para a paz é a contramão do que se verifica no âmbito das disputas partidárias, das oligarquias e na egoísta busca pela manutenção de privilégios, dos “foros especiais” que facilitam as contravenções.
Não podem ser permitidas as “violências do colarinho branco” que buscam atender, por exemplo, as hegemonias pretendidas pelo capital financeiro. Isso inclui condenar e combater qualquer negociação tácita de soberanias, a perda de controle sobre riquezas que deveriam ser administradas para o bem do povo. Se essa direção não for seguida, prevalecem as estratégias para acobertar privilégios, que se desdobram no crescimento da exclusão, na “vista grossa” para processos de corrupção que corroem o erário e os direitos sociais da população. Uma política para a paz, diz o Papa Francisco, é um estilo de viver que se assenta no princípio ético moral da intocável sacralidade da pessoa humana, imagem e semelhança de Deus. Quando não se respeita a dignidade mais profunda de toda pessoa, desconsidera-se o princípio da não violência. E as consequências são sempre nefastas: o caos social e político que emoldura nações, gera a predisposição para confrontos, guerras, roubos, autoritarismos, déficit moral que compromete governos.
Por isso, faz a diferença quando o povo se reveste do tecido de uma cidadania que se alicerça no estilo da política pela paz. Essa conduta deve se manifestar, particularmente, nos diferentes modos de expressão da vida cidadã – nas opiniões, debates, modos de reivindicar e, especialmente, na hora do voto – caminho democrático para se evitar transtornos políticos que conduzem a sociedade às muitas formas de violência. Não se pode, portanto, comprometer a paz com imposições políticas, com a perda do sentido da ética, com soluções que ignoram uma série de aspectos intocáveis nos procedimentos e nas decisões. Principalmente, não se combate a violência quando governos ou a participação cidadã na política ignora a urgente necessidade de enfrentar os cenários de degradação humana que revelam uma situação de guerra no país.  Afinal, as estatísticas de degradação e de mortes no Brasil superam os números de muitas guerras mundo afora.
A paz é a única e verdadeira linha do progresso humano, diz o Papa Francisco, e não as tensões de nacionalismos ambiciosos, nem as conquistas violentas, nem as repressões geradoras de uma falsa ordem civil. A não violência exige valores humanísticos e religiosos do amor, da verdade, da justiça e da razão. Quando se percebe a carência desses valores, são identificadas as causas dos graves problemas sociais – desmandos, ganâncias, mesquinhez e a inteligência totalmente investida para se alcançar simplesmente vantagens pessoais.
O Papa Francisco deseja que sejam a caridade e a não violência a nortear o tratamento recíproco – nas relações pessoais, sociais e internacionais. É hora de debelar todo tipo de vingança para frear a escalada de descalabros, que incluem guerras devastadoras, os muitos conflitos que vão se prolongando neste terceiro milênio. O Papa Francisco chama a atenção a respeito da violência que se revela de modo diverso, em diferentes contextos – nos presídios, terrorismos, criminalidade, ataques armados, abusos sobre migrantes, devastação ambiental e tráfico humano. É urgente uma compreensão lúcida sobre o conjunto desses cenários. E as mudanças necessárias não serão alcançadas com revides e vinganças, mas a partir dos entendimentos e do altruísmo. Os líderes mundiais, governamentais, religiosos e políticos estão desafiados a mensurar, sabiamente, suas propostas, o sentido de suas posturas e atitudes, emoldurados pelo mais qualificado sentido humanístico e dialogal. Assim, evita-se a crueldade no sistema prisional, o recrudescimento do ódio, das revoltas e das vinganças. Devem ser prioridades: a seriedade no cumprimento das responsabilidades, a transparência no desempenho de funções e a obediência ao princípio fraterno-solidário de considerar a importância do “outro”. Mais poderosa que a violência é a não violência, estilo efetivo e revolucionário de uma política para a paz.
Por Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte