Após a participação efetiva no processo de escuta, as comunidades da Amazônia receberam de presente após o Sínodo sobre a região a exortação apostólica Querida Amazônia. O documento do Papa Francisco apresenta quatro sonhos do pontífice para a Pan-Amazônia, os quais fortalecem e se identificam com os sonhos dos povos indígenas, segundo o bispo de São Gabriel da Cachoeira (AM) e presidente do Regional Norte 1 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
Nesta segunda matéria sobre os dois anos da exortação apostólica pós-sinodal Querida Amazônia, divulgada no dia 12 de fevereiro de 2020, o Portal da CNBB partilha as reflexões do bispo responsável pela diocese considerada a mais indígena do Brasil dadas em entrevista ao assessor de comunicação do Regional Norte 1, padre Luis Miguel Modino.
Segundo dom Edson, “os sonhos do Papa Francisco na Querida Amazônia vieram fortalecer os sonhos dos povos indígenas da diocese de São Gabriel da Cachoeira”. O bispo destaca que os povos da região “se identificam plenamente com os sonhos do Papa Francisco, ainda mais quando são chamados guardiões da floresta”.
Sonho Eclesial
No início de sua exortação, antes de apresentar os quatro sonhos para a região amazônica, o Papa Francisco destaca que “tudo o que a Igreja oferece deve encarnar-se de maneira original em cada lugar do mundo, para que a Esposa de Cristo adquira rostos multiformes que manifestem melhor a riqueza inesgotável da graça”. Assim, “deve encarnar-se a pregação, deve encarnar-se a espiritualidade, devem encarnar-se as estruturas da Igreja”.
Essa motivação tem sido experimentada em São Gabriel da Cachoeira. Dom Edson recorda o Sonho Eclesial e conta que “já há tempo estão acontecendo celebrações inculturadas, com danças indígenas, cantos nas diferentes línguas, um começo para irmos elaborando uma missa no rito amazônico”.
Um princípio pastoral que orienta a diocese em todas as atividades é o seguinte, de acordo com dom Edson: “‘a Boa Nova das culturas indígenas acolhe a Boa Nova de Jesus’. Antes da chegada dos missionários, o Espírito Santo estava agindo a través das semina Verbi, que foram colocadas nos corações dos povos indígenas e nas culturas desta região”.
Sonho ecológico
Na exortação apostólica, o Papa recorda a encíclica Laudato Si’ e salienta que a sabedoria dos povos nativos da Amazônia “inspira o cuidado e o respeito pela criação, com clara consciência dos seus limites, proibindo o seu abuso”. Francisco destaca que os indígenas, “‘quando permanecem nos seus territórios, são quem melhor os cuidam’ desde que não se deixem enredar pelos cantos das sereias e pelas ofertas interesseiras de grupos de poder”.
E essa também é a observação feita por dom Edson Damian. Sua diocese, que abrange a imensa bacia do Rio Negro, com 294 mil quilómetros quadrados, “é a região melhor preservada da Amazônia”. O bispo lembra que “menos de 10% da floresta foi derrubada, e isto se deve à presença dos povos indígenas. Noventa por cento da população são povos indígenas de 23 etnias e ainda falam hoje 18 línguas”.
“Eles conhecem os segredos da terra e a tratam como mãe, como casa comum”, resume dom Edson.
Sonho Cultural
Para Francisco, ao falar do Sonho Cultura, promover a Amazônia implica fortalecer a identidade, mostrar aquilo que possui de melhor. “Assim como há potencialidades na natureza que se poderiam perder para sempre, o mesmo pode acontecer com culturas portadoras duma mensagem ainda não escutada e que estão ameaçadas hoje mais do que nunca”.
Em São Gabriel da Cachoeira, algo novo já começa a acontecer para concretizar o sonho cultural do Papa Francisco, segundo destaca o bispo: “Estamos realizando entre nós, em colaboração com a Rede de Educação Intercultural Bilingue na Amazônia (REIBA), o primeiro núcleo da educação escolar indígena bilíngue com a ajuda da REPAM e dos padres jesuítas”.
O processo sinodal
Dom Edson também recordou o caminho do sínodo para a Amazônia. Para ele, “a convocação do querido Papa Francisco para realizar um Sínodo Especial para a Amazônia, provocou grande alegria e esperança entre as comunidades”.
“Nós ficamos muito felizes porque foi escolhido o padre Justino Sarmento Rezende para ser perito na elaboração do documento de preparação para o Sínodo, o primeiro padre salesiano indígena da nossa região”, conta.
Dom Edson também faz memória de que, ao receber o Documento Preparatório, “as comunidades indígenas responderam com muita alegria as perguntas”. Nesse ponto destaca: “ouvi várias pessoas dizer: pela primeira vez o Papa quer escutar os povos indígenas, e como se sentiam felizes em participar”.
“Para a realização do Sínodo, por ser a diocese mais indígena do Brasil, teve uma representação muito significativa na Assembleia Sinodal, pois lá estava o padre Justino como perito, e foram escolhidas mais duas religiosas indígenas, de duas diferentes congregações”, lembra o bispo.
Com informações e imagens de Padre Luis Miguel Modino/CNBB Norte 1
Fonte: CNBB