Sacerdote: o Bom Pastor como promessa de Deus a seu povo

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O livro do profeta Ezequiel, especificamente no capítulo 34, traz uma admirável exortação aos pastores de Israel, abordando como discernir quem são os bons e maus pastores, como também as consequências de ser um mau pastor. Na Sagrada Escritura, quase sempre, a figura do pastor é associada ao encarregado de cuidar de ovelhas ou gado. Porém, ao longo da história, esse título também era atribuído aos reis, soberanos e chefes do povo, em caráter religioso ou civil. Abraão, Jacó, Moisés, Davi foram exemplos de pastores não somente de ovelhas, mas do povo. Civilmente, este termo fora atribuído a muitos soberanos, podendo citar como exemplo as palavras do profeta Isaías, onde o rei Ciro é chamado de pastor (cf. Is 44, 28).

Deus sempre se preocupou com seu povo que desde toda a eternidade já havia elegido, cercado de carinho e proteção. Em dado momento da história, aqueles a quem os pastores deviam guiar e cuidar, estavam, pelo contrário, sendo maltratados; aqueles que deveriam zelar, proteger, guardar das feras, alimentar, apascentar, cuidar das doentes, restaurar o vigor das abatidas, tratar as feridas, ao invés disso, estavam aproveitando-se do que as ovelhas podiam lhes proporcionar e as usavam somente para benefício próprio. Deus, que é zeloso para com seu povo e abomina os maus pastores, manda Ezequiel profetizar contra estes (Ez 34, 1-4): “A palavra de Iahweh me foi dirigida nestes termos: Filho do homem, profetiza contra os pastores de Israel, profetiza e dize-lhes: Pastores, assim diz o Senhor Iahweh: Ai dos pastores de Israel que se apascentam a si mesmos! Não devem os pastores apascentar o seu rebanho? Vós vos alimentais com leite, vos vestis de lã e sacrificais as ovelhas mais gordas, mas não apascentais o rebanho! Não restaurastes o vigor das ovelhas abatidas, não curastes a que está doente, não tratastes a ferida da que sofreu fratura, não reconduzistes a desgarrada, não buscastes a perdida, mas dominastes sobre elas com dureza e violência.”

Por esse desserviço dos maus pastores, as ovelhas se perdiam e eram alvos fáceis das feras. Mas, por amor, o Senhor Deus irá bani-los, pedirá conta desse mau ofício e ele mesmo apascentará o seu rebanho.

10. Assim diz o Senhor Iahweh: Eis-me contra os pastores. Das suas mãos requererei prestação de contas a respeito do rebanho e os impedirei de apascentar meu rebanho. Deste modo os pastores não tornarão a apascentar-se a si mesmos. Livrarei minhas ovelhas da sua boca e não continuarão a servir-lhes de presa. 11. Com efeito, assim diz o Senhor Iahweh: Certamente eu mesmo cuidarei do meu rebanho e o procurarei. 12. Como um pastor cuida do seu rebanho, quando está no meio das suas ovelhas dispersas, assim cuidarei das minhas ovelhas e as recolherei de todos os lugares por onde se dispersaram em um dia de nuvem e de escuridão.

Vê-se aqui que o próprio Deus promete que irá, com amor, cuidar do seu rebanho, conduzirá a pastos verdejantes, cuidará das feridas, buscará as perdidas, curará as chagas das doentes, restaurará o vigor das abatidas, as gordas e as saudáveis ele as apascentará. Deus, cumprindo o verdadeiro ofício de um bom pastor, também se compromete a suscitar um pastor que as instrua, faz uma aliança de que as ovelhas serão bem cuidadas e protegidas.

12. Como um pastor cuida do seu rebanho, quando está no meio das suas ovelhas dispersas, assim cuidarei das minhas ovelhas e as recolherei de todos os lugares por onde se dispersaram em um dia de nuvem e de escuridão. 13. Trá-las-ei dentre os povos, reuni-las-ei dentre as nações estrangeiras e reconduzi-las-ei para o seu solo, apascentando-as sobre os montes de Israel, nas margens irrigadas dos seus ribeiros e em todas as regiões habitáveis da terra. 14. Apascentá-las-ei em um bom pasto, sobre os altos montes de Israel terão as suas pastagens. Aí repousarão em um bom pasto e encontrarão forragem rica sobre os montes de Israel. 15. Eu mesmo apascentarei o meu rebanho, eu mesmo lhe darei repouso, oráculo do Senhor Iahweh. 16. Buscarei a ovelha que estiver perdida, reconduzirei a que estiver desgarrada, pensarei a que estiver fraturada e restaurarei a que estiver abatida. Quanto à gorda e vigorosa, guardá-la- ei e apascentá-la-ei com o direito.

O pastor que o Senhor Deus prometera a Ezequiel é seu Filho Unigênito, a promessa se cumpre com a encarnação do Verbo, este que outrora falara pela boca dos profetas agora fala diretamente a seu rebanho.

Fazendo uma rápida análise etnológica ao termo “Bom Pastor” que nos trazem as traduções mais populares da Bíblia, vemos que sim, Jesus é o bom pastor. Porém, o texto do Evangelho segundo São João, no capítulo 10, no original grego, pode ser traduzido como o “Verdadeiro Pastor”. Não simplesmente ressaltando sua bondade, mas proclamando com profunda autenticidade, Jesus mesmo assegura claramente ser o verdadeiro pastor, quando em João 10,11 (cf. Eu sou o bom pastor: o bom pastor dá sua vida pelas suas ovelhas) se autodenomina como tal. Ele mesmo guiará o seu rebanho, irá conduzir, tratar e revigorar as desanimadas, alimentar as famintas, cuidar das sadias com justiça e retidão, pois conhece cada uma de suas ovelhas e elas O conhecem. Isso se realiza em plenitude no alto da Cruz, quando, de fato, dá sua vida para salvar suas ovelhas.

Após sua morte e ressurreição, Cristo volta de forma gloriosa ao Pai, mas permanece entre nós como Pão Vivo descido do céu por meio da Eucaristia, tal como instituiu o sacerdócio para que os sacerdotes sejam pastores semelhantes a Si. Os sacerdotes são os verdadeiros pastores que Deus outrora prometera no Antigo Testamento e o são porque Jesus mesmo os instituiu, não unicamente como representantes, mas de forma ontológica e profunda, agem como Cristo, são um outro Cristo, como sinais concretos do amor de Deus para com o seu povo. Com efeito, o sacerdote é “Alter Christus”, esta é a suprema e verdadeira identidade do padre, prolongar a presença de Cristo, ser o mesmo Jesus, filho unigênito do Pai, entre os homens, em sua missão de conduzir o rebanho de Deus e não há no universo algo de maior dignidade.

Em Jeremias, Deus afirma que dará ao povo pastores segundo o seu coração (cf. Jr 3, 15). Não é em vão que São João Maria Vianney cita: “O sacerdote é o amor do coração de Jesus”. Na ordenação presbiteral, o sacerdote se torna idôneo a emprestar todo o seu ser para Cristo, suas mãos para consagrar e abençoar, sua voz para Cristo falar. Na Santa Missa, Jesus, por intermédio do sacerdote, pelas palavras da consagração, muda substancialmente o pão e o vinho em seu Corpo e Sangue. Vale salientar que o sacerdote não é um mero instrumento que Cristo utiliza como algo descartável, pois o mesmo se identifica com Cristo ontologicamente, no mais profundo do seu ser e existir. Dom Rafael Cifuentes no célebre livro “Sacerdotes para o terceiro milênio” afirma que, “ele [o padre] atua não apenas em nome, mas também na pessoa de Cristo, dentro do perfil da sua personalidade, olhando através das suas pupilas, sentindo nas próprias vísceras as sensações de Cristo, expressando com a boca os sentimentos de Cristo”.
Jesus, instituindo o sacerdócio, ordena essa missão aos sacerdotes quando diz: “Eu mesmo apascentarei minhas ovelhas” (cf. Ez 34, 15). O padre é, então, o cumprimento da promessa de Deus, pois agindo por, com e em Cristo abre as portas do céu para suas ovelhas, devendo amá-las a todo o momento e estar disposto a doar sua própria vida em favor do seu povo e de sua Igreja.

Pe. Eguimar Matias dos Santos